Ele.

Eu guardo em mim um recalque danado de alguns compositores e escritores brasileiros. Muita coisa publicada ou gravada eu gostaria de ter assinado a autoria. Fosse eu contemporânea de Machado de Assis, por exemplo, talvez tivesse dividido (quiçá desbancado) com o baixinho monarquista o topo do realismo brasileiro. Com Chico é mais ou menos a mesma coisa. Fosse eu uma das almas femininas que ele tão bem descreveu, talvez tivesse desenrolado para outras histórias que renderiam outras fantásticas canções, colocando o filho do seo Sérgio em segundo plano.
Enfim.
Devaneios bobos apenas rsrs.
Nasci leitora e ouvinte, admiradora desses e de tantos outros artistas, escritores e compositores que representam algo para mim. Com Chico, porém, tem uma relação mais íntima. Lá pelos anos de faculdade tive uma paixonite. Sim, paixonite pelo Chico. Aquela coisa meio ídolo-fã, mas que ia um pouco além. Eu tinha certeza que em algumas músicas ele estava falando comigo (Não se afobe, não que nada é pra já/ amores serão sempre amáveis/ futuros amantes, quiçá se amarão sem saber/com o amor que eu um dia deixei pra você - essa eu tinha certeza que era para mim rsrs). Com o passar do tempo, no entanto, comecei perceber que Chico cantava (ou cantavam por ele) coisas que estavam aqui, guardadas. Era como se ele fosse a reverberação de uma voz interior. Não, eu não seria o novo amor de Chico. O gatão charmoso de olhos verdes, voz anasalada e fala não muito eloquente era só o cara que conseguia me fazer sentir o amor, a dor, a suavidade, a crueza, o desumano, o desigual, a beleza e tantas outras formas que a vida toma em cada momento, contexto, sociedade e dentro de cada ser.
É.
Chico, o gatão de olhos verdes, voz anasalada e fala não muito eloquente, foi realmente apenas uma paixonite. Mas sabe que as vezes eu acho que ele tenta me seduzir de novo? Quando estou eu aqui, distraída, ouvindo outras vozes, experienciando outras canções, lá vem ele. Charmoso, atual, direto, cutucando lá no fundo da alma (hoje afinal conheci o amor/e era o amor uma obscura trama/não bato nela nem com uma flor/mas se ela chora, desejo me inflama - vai, Chico, vai provocando..rs).
O fato é que ele ainda causa aquela euforia quando ligo o rádio e lá está ele, cantando em pessoa para mim. E para outras. E para outros também. Chico é assim. Canta para todos, um sedutor nato. Hoje ele faz 70 anos. Gatão, olhos verdes, voz anasalada, fala não muito eloquente e que continua com aquela capacidade única de simplificar em poesia a imensa complexidade do existir. "Olha, será que ela é moça/será que ela é triste/será que é o contrário/será que é pintura/o rosto da atriz/Se ela dança no sétimo céu/se ela acredita que é outro país/e se ela só decora o seu papel/e se eu pudesse entrar na sua vida". Você já entrou, Chico. Há muito tempo.

3 comentários:

Silvia disse...

Só um comentário: listinha. hehehe

Fernanda Miguel disse...

heheheheheh. boa! bem lembrado!

Carol Ferreira disse...

Bom ler textos seus de novo, flor! O Chico é fogo. Preferiu a do cabelo cor de abóbora... Se fosse você, ele ia curtir mais, pois além de todas as suas óbvias qualidades, você não ignora o baião, prefere ir até a esquina com ele - flórida???, enfim, o blues ia valer mais a pena!

Related Posts with Thumbnails

Copyright © 2008 - O quarto "R" - is proudly powered by Blogger
Blogger Template